Você não sabe quanto eu caminhei…

… Pra chegar até aqui!

Percorri degraus e mais degraus na subida do Morro da Chacrinha, que fica no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, óbvio. Nesse dia nós estávamos esperando por uma programação completamente diferente, quando surgiu o convite para conhecer uma realidade bem diferente da nossa. Mas nada óbvio foi ver o quanto uma senhora acima de 70 anos, cheia de vigor, subia aquela elevação com agilidade, cumprimentando todos os transeuntes e sabia o que se passava com cada um desses moradores da favela.

Irmã Zilca e Maridex
Essa comunidade, como as pessoas preferem chamar – e é disso que se trata –  é composta basicamente por afrodescendentes e nordestinos. Por isso nossa presença causava estranheza  aos seus moradores. Sua presença nesse morro é significado de um grande risco, em função dos desabamentos que já se tornaram comuns em épocas de chuva, freqüentes em começos de cada novo ano.
Lá, existe uma vida, com creche da Prefeitura; tendinhas que vendem comidas, bebidas e até promovem shows; residências-dormitório, pois a maioria dos moradores trabalha longe do bairro; igrejas diversas; centro comunitário; barbearia; e existe também uma série de coisas que não devemos ter percebido.

As Três Marias, sustentadas por colunas de concreto   para não levarem as casas abaixo
Esse pessoal que mora lá ia vendo que chegamos com a Irmã e o olhar de curiosidade/desconfiança se desanuviava, pois ela mora e trabalha na comunidade desde a década de 1970, fazendo um papel educativo além de os de visitação, evangelização, participação em reuniões onde se decide muitas coisas sobre a vida comum, como uma assembléia de condomínio e lida com pessoas muito sofridas, mas também com lideranças de todos os tipos.

Tivemos oportunidade de conhecer o trabalho da creche municipal e o contraste com a escolinha/creche que o Caio freqüentou era grande; não em termos de organização, pois livrinhos, brinquedos e demais dispositivos educativos eram bons, cuidados, mas de espaço aberto e de circulação, tendo em vista questões de possibilidades de invasões, furtos, disputas de territórios entre grupos diversos…


Tem também uma ONG que realiza um trabalho todo voltado para a saúde do idoso. Imaginem ser idoso e residir num morro, subindo e descendo escadas para poder ir ao médico, fazer documentos, atividades rotineiras? – E há muitos representantes da terceira idade por lá… Inclusive uma senhora de oitenta e poucos anos que foi quem conquistou o direito de representar aquele grupo de moradores para exigir saneamento básico mínimo e energia elétrica chegarem ao morro, com muita disposição e garra, persistindo e ganhando a todos com a sabedoria e cordialidade típicas do povo carioca.
Muito é preciso para a melhorar a vida dessa população que vivencia a pobreza, mas vimos a UPP ali, presente, garantindo que um mínimo de calmaria exista nesse mundo de tantos contrastes entre o que eles chamam de asfalto e a própria realidade.
Essas casas, pelo menos, eram de concreto…


Ainda terei muitas oportunidades de lembrar os momentos vividos nesse local onde a vista é linda, as dificuldades imensas, mas o sorriso caloroso de quem não se entrega na primeira queda e celebra a vida intensamente, como poderemos ver a cada novo retorno à Cidade Maravilhosa, onde nem tudo é Carnaval e o mito de que as pessoas vivem apenas jogando futevôlei é derrubado no primeiro instante.

Descer as escadas não pode significar virar as costas!
Sou grata à Irmã Zilca pelo convite. Pelas reflexões que me oportunizou e nem cabem aqui. Uma aula sobre como podemos fazer um trabalho de formiguinha e continuarmos otimistas, mesmo em situações que parecem dizer o contrário.